Se eu quisesse ser mal intencionado poderia pensar que alguém no
Ministério Público estaria a encarar com grande preocupação a provável
substituição de Joana Marques Vidal por quem se revele menos zarolho nas
investigações passíveis de gerarem capas do «Correio da Manhã» e decidiu enviar
um recado ao governo sob a forma da investigação sobre os bilhetes para o
futebol do ministro Mário Centeno. Algo do género: «atrevam-se a mexer no nosso
arranjinho, que nem o presidente do Eurogrupo escapa!» É que, não só a ministra
da Justiça se descaíra a prever a mudança de rosto à frente da
Procuradoria-Geral da República, como vem crescendo em volume o intenso clamor
pela urgente substituição de quem tem mostrado uma tão explicita passividade
face à facilidade com que tem sido violado o segredo de Justiça nos processos
confiados aos seus subordinados.
Se o mandato de Joana tivesse acabado em vésperas do final da anterior legislatura, Passos Coelho repetiria o que fez com o Banco de Portugal, conseguindo ter mais um dos «seus» em funções durante os quatro anos da governação socialista. Para azar dos que têm garantido neste seis anos de mandato da Procuradora uma contínua parcialidade a seu favor, está na hora de mudar o rumo no comportamento do Ministério Público, tornando-o efetivamente respeitador da legalidade democrática - não só salvaguardando o referido segredo de Justiça, mas também investigando e condenando quem o viola (desde as fontes internas até quem as publica!), só assim se cumprindo o principio da presunção de inocência dos arguidos desde a fase instrutória dos processos até ao fim do seu julgamento).
É claro que a campanha dos «da Joana» vai tendo várias vertentes: esta
semana até regressou à boca de cena um magistrado - conhecido por organizar um
Congresso da sua classe com o alto patrocínio do Grupo Espírito Santo -, a
pretexto de um livro em que defende a tese absurda de nunca a Justiça ter
estado tão afetada na sua independência relativamente ao poder político como
terá sucedido quando Pinto Monteiro era o Procurador e José Sócrates o
primeiro-ministro. Está visto que aquele sobre quem o anterior Procurador
comentou que o facto de ter chegado onde chegou só denota a mediocridade que
hoje grassa no Ministério Público, quer-nos tomar por tolos. Algo que manifestamente
não somos.
Apesar dos danos suscitados durante uns dias à irrepreensível reputação
do ministro - inclusive com repercussões internacionais! - quem terá tido a
peregrina ideia de lançar esta lebre a coberto de uma manchete do «Correio da
Manhã», logo secundada pelo «Observador» e pelo «Expresso», deve estar
arrependido de o ter feito. Porque a investigação revelava-se tão coxa, tão
desconchavada, que acabou por ser criticada pelos próprios tenores da direita
comentarista nos diversos jornais e canais de televisão, deixando sem rede de
proteção - a não ser no anonimato com que estas coisas são escondidas - o
clandestino autor. Depois do sucedido ficou ainda mais demonstrado - se ainda
mais provas fossem necessárias! - que já ontem era tarde para que Joana Marques
Vidal seja substituída.
No meio disto tudo o nosso selfieman, que tanto gosta de comentar tudo
e mais alguma coisa, procedeu para com esta ignomínia com a mesma «distração»,
que dedicou ao caso Tecnoforma ou à luta das operárias da Triumph. Assobiou
para o lado, tirou mais um boneco, deu mais um abraço … e seguiu em frente como
se fosse algo com que não tivesse a haver...
Publicada por jorge rocha
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