Discordo claramente desse posicionamento, mais emotivo do que racional.
Não constitui regra imprescindível das teorias militares que se procure saber o
que se passa no outro lado da trincheira? Como se pode vir a ser eficaz no
combate a quem nela se situa se não se lhe conhecerem as estratégias?
A publicação em papel desta semana traz muitas matérias a merecerem o
nosso comentário e por isso serão tratadas em mais do que um texto.
A começar temos a colaboração regular, que mais costuma merecer a minha atenção: o cartoon de António, normalmente capaz de por si mesmo substituir mil palavras. É o caso do que se passa esta semana com o calvário de D. Manuel Clemente, subitamente confrontado com o quão disparatada terá sido a mediática opinião sobre o sexo entre recasados. Por isso arranjou forma de tentar corrigir o erro, fazendo-se entrevistar pelo próprio diretor do semanário. Afinal não teria querido dizer propriamente o que terá saído da sua pena. Pelo contrário nós é que somos culpados da situação, porque o teremos interpretado mal. Pondo-se no papel de vítima incompreendida, o cardeal quer sair bem no filme, mas foi tão evidente o seu ultramontanismo, que nem pintando-se de que cor fosse, conseguiria apagar mais uma significativa mancha no seu já escuro currículo.
Chamado também para assunto de capa veio Cavaco Silva de quem se
publica extensa entrevista na Revista. Sem prejuízo do que sobre ela virei a
comentar fica já sublinhado o grande objetivo dos editores, que dela
selecionaram como tema preferencial o da renovação do mandato de Joana Marques
Vidal. O que vai ao encontro do que se tem ouvido a vários participantes no
Congresso do PSD: para a direita será fundamental que as coisas continuem tal
qual estão no reino corrupto do Ministério Público. Quanto temem que, com a
saída da Procuradora-Geral, a Justiça se manifeste menos zarolha e, em vez de
parecer cingir-se politicamente ao que lhes convirá explorar, se passe a dar
maior atenção a casos até aqui desprezados como os dos submarinos ou o da
Tecnoforma!
É igualmente curiosa a preocupação do principal órgão de comunicação
enfeudado às direitas em dar voz à sinistra múmia, que tanto mal causou a
milhões de portugueses, apesar de por eles ter sido sucessivamente guindado aos
principais cargos da República (o que nos fez, amiúde, desconfiar da sua
sageza!). Será que querem preparar-lhe um vistoso funeral de Estado, quando
alguém for suficientemente persuasivo para o informar de estar há muito morto e
ninguém lhe ter dito nada? Se o filho do gasolineiro ainda tem alguma ilusão
quanto a ser homenageado na mesma dimensão em que o foram Mário Soares e,
sobretudo, Álvaro Cunhal, bem pode tirar o cavalinho da chuva. Nem a
persistência dos seus tenazes admiradores bastará para que a cerimónia venha a ser
pouco mais do que privada.
Saindo dos assuntos trazidos para a capa do primeiro caderno entramos
na segunda página e, finalmente, Martim Silva consegue pôr António Costa a
encabeçar os Altos da sua coluna sobre quem está em evidência pelo que ele
ajuíza serem bons ou maus motivos. Nem o esforçado Martim consegue ignorar “o
maior crescimento real deste século (…) em convergência real com a Europa.” Tal
reconhecimento confirma que, na redação do «Expresso», se adivinham tempos
difíceis para quem lhes vai no coração, politicamente falando. E isso é óbvio
no tom lastimoso de Pedro Santos Guerreiro, diretor do jornal, no seu
editorial. Pressente-se-lhe a angústia de constatar um Congresso laranja
marcado pelo cinismo de quem aplaude Rio “com as mãos moles e a ponta e mola no
bolso.” E, logo identifica quem se apresta a conspirar contra o novo líder:
“São os da corte ameaçada, são os patinadores no gelo que nunca passam das
ameaças e são as máquinas de calcular futuros, os seus próprios futuros.
Ouve-se o barulho do acelerador mas cheira a embraiagem. Para meter a próxima
mudança.” Pode-se não apreciar o que lhe vai na alma, mas tem de se reconhecer
o bom estilo! E acaba com um apelo
lancinante: “[Rio] ganhou o direito de ser apoiado pelo partido que, antes dele,
já sofria de raquitismo político, intelectual - e eleitoral”.
Na mesma página outro dos jornalistas mais conotados com a direita no
semanário (Filipe Santos Costa) alinha as áreas sobre as quais seriam
desejáveis acordos do Bloco Central e a que insiste em chamar «reformas
estruturais»: a Justiça (ou seja dar ainda mais força aos que querem dela
servir-se para conseguirem que a vontade expressa pelos eleitores possa impedir coisas esdrúxulas como foi
exemplo a investigação a Mário Centeno), o sistema político (ou seja o
favorecimento de condições para maiorias absolutas de direita e limitações
engenhosas às que se possam formar à esquerda), a descentralização (ou seja a
criação de muitos cavaquistões) e a Segurança Social (ou seja privatizando-a e
cortando a eito na “peste grisalha”). Por muitas ilusões que as direitas tenham
quanto à exequibilidade de tal projeto não contará com o beneplácito de um
Partido Socialista que, pela voz de Pedro Nuno Santos já veio esta semana
expressar outra interpretação para o que considera reformas necessárias para o
país.
Ficámos ainda assim a saber que, nem sequer entre os seus, Rio consegue
ter garantidos apoios para as armadilhas internas, que lhe estenderão passo a
passo, contando, ainda assim, na sua equipa com um valete cavaquista do
gabarito de Nunes Liberato, que em Belém terá assistido e quiçá participado em
muitas inventonas contra José Sócrates. Tratando-se de um notório cortesão da
já referida múmia podemos depreender que o sentido da expressão «diz-me com quem
andas…» faz todo o sentido para quem da política se cola a ajudantes de
caudilhos tão pouco recomendáveis…
Publicada por jorge rocha
Do blogue (Ventos Semeados)
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